Saiba como é operação da UHE Sá Carvalho durante eventos de cheias no rio Piracicaba
Qual é a real capacidade da UHE Sá Carvalho de evitar cheias no rio Piracicaba e como é sua operação?
Publicado em 06/01/2023 20:00
A Usina Hidrelétrica (UHE) de Sá Carvalho fica localizada na cidade de Antônio Dias, no Vale do Aço, em Minas Gerais, e possui dois barramentos considerados a fio d’água (Antônio Dias e Severo) interligados por túneis. A barragem Antônio Dias está instalada no Rio Piracicaba, enquanto a de Severo encontra-se no Ribeirão Severo.
Apesar do arranjo diferenciado, para regimes de cheias o ponto mais importante de monitoramento é o reservatório de Antônio Dias, que usualmente é visível da ferrovia Estrada de Ferro Vitória-Minas (EFVM) ou às margens do acesso ao parque industrial da barragem.
É comum verificarmos vídeos pelas redes sociais e portais de internet quando, em regime de cheias, os extravasores do barramento de Antônio Dias da UHE Sá Carvalho são abertos. Por que é necessário liberar toda aquela água vista nos vídeos?
Construída em concreto gravidade, a Barragem Antônio Dias conta com 112 m de comprimento de crista e 14,80 m de altura máxima. Com um reservatório de apenas 1,725 hm³ de volume e uma área inundada de 0,83 km², seu estoque de água é muito pequeno. Ou seja, a vocação para operação da UHE Sá Carvalho é o que podemos classificar como usina a fio d’água. Detalhando melhor, à medida que o rio passa por um período de seca, a instalação gera menos energia. Já quando ocorrem eventos chuvosos mais significativos, é necessário passar essa água em excesso pelos órgãos extravasores da barragem, que são os dispositivos projetados para a liberação do excesso de água que não é possível utilizar para a geração de energia. Essa liberação de água é denominada vertimento.
O sistema extravasor de Antônio Dias é composto por duas comportas de fundo de menor capacidade, utilizadas usualmente em períodos de seca ou para esvaziar o reservatório em casos de manutenções.
O principal extravasor da barragem é composto por cinco vãos na barragem, operados por dois níveis de taipas pivotantes superpostas, e uma comporta de setor sobreposta às taipas. Para entender melhor, esses vãos são seções da barragem em que o concreto está em um nível mais baixo para permitir a liberação do vertimento quando necessário.
Municípios envolvidos
O Rio Piracicaba, que tem sua nascente a quase 150 km da barragem de Antônio Dias, ainda percorre outros 50 km até desaguar no Rio Doce, no município de Ipatinga. Assim, toda a chuva que cai desde a região de Ouro Preto, Barão de Cocais, Santa Bárbara, São Gonçalo do Rio Abaixo, João Monlevade, Catas Altas, Rio Piracicaba, Nova Era e Antônio Dias drena ao longo dos afluentes que alimentam a calha principal do corpo d’água que chega ao reservatório em questão.
Ainda assim, ao passar pelo complexo da UHE Sá Carvalho, as águas do Rio Piracicaba seguem em direção aos municípios de Jaguaraçu, Timóteo, Coronel Fabriciano e Ipatinga. Cada cidade possui seu ordenamento de ocupação do solo e assim, diferentes níveis do rio a partir do qual se iniciam as inundações.
Por que abrimos comportas?
Como qualquer instalação, os reservatórios das usinas hidrelétricas possuem um limite para acumulação de água. De forma direta, quando as instalações atingem seu nível máximo, é preciso liberar toda a água que está chegando no reservatório para que ela não cause um acidente com a estrutura ou simplesmente passe por cima das barragens, aumentando o risco para a população.
Contudo, as aberturas que podem causar risco de inundações são avisadas previamente pela Cemig aos órgãos de resposta, para que as medidas necessárias sejam tomadas. Considerando a baixa capacidade de armazenamento da UHE Sá Carvalho, na prática, é como se a existência da barragem não influenciasse em nada durante um evento natural de cheias. Ou seja, se a usina não existisse, o rio encheria da mesma maneira quando comparado ao fato de o barramento. Dessa forma, invariavelmente, à medida que mais água vem chegando pelo rio Piracicaba, há a necessidade de ampliar a liberação de seus vertedouros.
Em todos os casos, a vazão liberada em momentos de cheia não é superior à vazão que o reservatório está recebendo – no máximo igual. Assim, as usinas a fio d’água, na maioria das vezes, atenuam o efeito das cheias e, no máximo, reproduzem o efeito das vazões naturais, não agravando a situação em nenhuma hipótese.
É possível não abrir comportas?
Anteriormente, estávamos falando que o reservatório de Antônio Dias possui uma capacidade muito reduzida de armazenamento. Na prática, fazendo uma conta simples para exemplificar isso, vamos considerar, hipoteticamente, que o reservatório está recebendo 1.000 m³/s, uma vazão típica de um evento chuvoso. Supondo que o reservatório estivesse totalmente vazio, ou seja, no seu mínimo operativo, teríamos 1.725.000 m³ de estocagem livre para amortecer esse efeito. O máximo que a UHE Sá Carvalho consegue liberar de água sem que seja necessário abrir comportas é um patamar de cerca de 80 m³/s, ou seja, estaríamos guardando 920 m³/s ao não abrir comportas. A conta passa a ser então: em quanto tempo o reservatório encheria?
Para isso, simplesmente dividimos 1.725.000 m³ (capacidade máxima do reservatório) pelo saldo que o está alimentando, totalizando então 1.875 segundos! Ou seja, 31 minutos. Ainda assim, o exercício aqui é apenas para entendermos o porte do reservatório. Para realizar tal operação, teríamos de considerar que essa vazão de 1.000 m³/s vem aumentando ao longo do tempo, o que já “gastaria” esse volume vazio, bem como todo aquele arranjo diferenciado de taipas e comportas que compõem os dispositivos extravasores do reservatório.
Então, de fato, vemos que o reservatório da UHE Sá Carvalho não possui vocação para funcionar para controle de cheias, por não ser um volume grande de estocagem.
Diferença de Três Marias e Sá Carvalho
Por que existem, então, casos de reservatórios onde ocorrerão cheias e que a Cemig consegue avisar com muita antecedência e/ou ter um plano mais suave de abertura de comportas? Ainda nesse ano de 2022, apesar das grandes cheias também vivenciadas na bacia do rio São Francisco, o reservatório da UHE Três Marias cumpriu um papel essencial de evitar um desastre natural ainda maior na região ao longo do rio. Acompanhando os eventos chuvosos ao longo de toda a bacia, a Cemig conseguiu emitir comunicados com 2 dias de antecedência, avisando que seria iniciado o vertimento para controlar o enchimento do reservatório.
A título de exemplo comparativo, vamos considerar as mesmas premissas do exercício que fizemos para a UHE Sá Carvalho. Considerando todo o volume útil do reservatório da UHE Três Marias de 14.974.100.000 m³, a mesma diferença de 920 m³/s levaria 188 dias para chegar ao nível máximo operativo da usina. Voltando a ressaltar que, na prática, a política operativa dificilmente permitiria iniciar o período chuvoso com o reservatório no mínimo operativo e que a vazão para início de inundação na bacia do rio São Francisco difere muito do rio Piracicaba, podendo-se assim observar o quão diferente é o porte de um reservatório dimensionado para ter o poder de regularização de vazões para eventos de seca e de cheia.
Onde ficar por dentro dos níveis dos rios e das vazões?
Ainda que não seja possível estocar vazões durante eventos de cheia na UHE Sá Carvalho, a Cemig mantém contato constante com as defesas civis locais sempre que limites acordados são ultrapassados. Tais limites são correlações entre vazões na usina e alertas junto aos municípios, que são obtidas por meio do histórico dos eventos ou por algum estudo de inundação por parte das equipes de defesa civil. Nos últimos anos, a Cemig protocolou junto aos municípios mais próximos de seus empreendimentos alguns mapas de inundação que podem nortear tais gatilhos para alertas, bem como fomentar uma cultura preventiva de avaliação dos riscos de tais eventos naturais.
Mas também é possível que a população tenha acesso à informação do nível do rio em diferentes pontos de medição. Além dos postos hidrométricos operados pela Cemig e disponíveis no aplicativo PROX, existe uma rede de monitoramento do nível do rio Piracicaba e alguns afluentes coordenada pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM). O Sistema de Alerta Hidrológico (SAH) estende sua rede desde o rio Santa Bárbara e cabeceira do rio Piracicaba até sua confluência no rio Doce, no município de Ipatinga.
Para cada posto, a partir de um sensor de medição de nível, são monitorados limites de atenção e início de inundação ao longo das cidades, com atualizações mais frequentes em regime de cheias. A figura abaixo apresenta a localização e nome de cada posto dentro da bacia hidrográfica em questão.
Para entender melhor como essa vazão trafega pelos rios até cada região, o fluxograma abaixo destaca a distância entre cada posto e o tempo médio que as cheias levam para ir de um posto até o próximo. Ou seja, quando se iniciam efeitos de subida do rio Pirac